Pedágio free flow: tudo o que você precisa saber
Sistema de pedágio em fluxo livre elimina cancelas e permite cobrança automática, e está em franca expansão, mas ainda enfrenta desafios de adesão, fiscalização e comunicação.
Imagem: Envato Elements
O sistema de pedágio free flow oferece uma alternativa às tradicionais praças de cobrança. Em síntese, o modelo permite que motoristas passem livremente pelos pontos de pedágio, sendo tarifados de forma automática e totalmente digital.
A novidade, entretanto, traz novas discussões sobre fiscalização, custos e adaptação dos condutores. Mas afinal, como o sistema funciona, onde já está em operação e como é feito o pagamento? Entenda essas e outras implicações.
Como funciona o pedágio free flow
O pedágio free flow (“em fluxo livre”) é um moderno sistema de cobrança de tarifas rodoviárias que elimina a necessidade de paradas ou a presença de cabines e cancelas nas vias.
Em vez do modelo tradicional, a cobrança é realizada por meio de uma estrutura eletrônica instalada sobre a rodovia, conhecida como pórtico. Conforme explica a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), esses pórticos são equipados com câmeras e sensores de alta tecnologia.
O sistema basicamente se desenvolve nas seguintes etapas:
- Trânsito livre: o condutor não precisa reduzir significativamente a velocidade ou parar. O veículo passa livremente sob o pórtico ou trecho eletrônico da rodovia, seguindo o fluxo normal do tráfego.
- Identificação automática: sensores, leitores de radiofrequência ou câmeras identificam o veículo automaticamente no momento da passagem. Essa identificação ocorre de duas maneiras principais: Leitura da placa do veículo; Leitura da etiqueta eletrônica (tag) instalada no para-brisa, quando o veículo possui o dispositivo.
- Geração da cobrança: após a identificação, o sistema registra a passagem do veículo e associa o evento à cobrança da tarifa de pedágio correspondente.
Você também pode se interessar:
Como pagar o pedágio free flow
A quarta e última etapa compete ao pagamento propriamente dito. Ele se desenrola de diferentes formas, e irá depender se o veículo possui ou não uma tag de pagamento eletrônico:
1. Para veículos com TAG (Pagamento Automático): quando o veículo possui uma etiqueta eletrônica válida (fornecida por operadoras como Sem Parar, ConectCar, Veloe, etc.), o pagamento é automático:
- O pórtico faz a leitura da tag.
- Em seguida, a tarifa é processada e debitada diretamente na conta ou na fatura da operadora da tag.
2. Para veículos sem TAG (Pagamento por Placa): nesse cenário, o pórtico registra a passagem pela leitura da placa. Assim, o motorista precisa efetuar o pagamento manualmente em um prazo determinado (normalmente, até 30 dias após a passagem). As concessionárias disponibilizam múltiplos canais para consulta e pagamento do débito:
- Via site da concessionária responsável, onde o débito é consultado informando a placa;
- Via WhatsApp, solicitando o pagamento por mensagem no canal de atendimento oficial;
- Via aplicativo próprio da concessionária;
- Via Bases totens de autoatendimento nas proximidades da rodovia.
Na maioria dos casos, os métodos de pagamento disponíveis incluem PIX, cartão de débito e cartão de crédito.
Multas e pontuação na CNH
De acordo com a regulamentação do Conselho Nacional de Trânsito (Contran), o motorista que não efetuar o pagamento da tarifa dentro do prazo estipulado comete a infração de evasão de pedágio, classificada como grave.
Nesse caso, a penalidade prevista é uma multa de R$ 195,23, além de cinco pontos adicionados à Carteira Nacional de Habilitação (CNH) do condutor.
O prazo para pagamento, que inicialmente era de 15 dias, foi estendido para 30 dias após a passagem pelo pórtico eletrônico. Caso o vencimento caia em um dia não útil, o limite se prorroga até o próximo dia útil.
Como o sistema ainda está em fase de expansão e aperfeiçoamento no país, muitos usuários têm enfrentado dificuldades e confusões, sobretudo pela falta de comunicação clara e de sinalização adequada em alguns trechos.
Leia também: Seguro de carro elétrico: veja comparativos de franquia e como fazer um
Marco regulatório no Brasil
O pedágio free flow já está presente em mais de 20 países. Contudo, na América Latina, apenas Chile e Brasil adotam oficialmente esse modelo, que representa um avanço significativo na modernização das rodovias. Por aqui, o sistema foi autorizado pela Lei nº 14.157, sancionada em 2021.
Em 29 de dezembro de 2022, o Contran publicou a primeira regulamentação específica sobre o tema, definindo os critérios técnicos e operacionais para o funcionamento do pedágio eletrônico de fluxo livre.
O primeiro teste prático ocorreu em 2023, quando a CCR RioSP instalou os primeiros pórticos de pedágio free flow na Rodovia Rio-Santos (BR-101), em três pontos: Paraty (km 538), Mangaratiba (km 447) e Itaguaí (km 414) — todos no estado do Rio de Janeiro.
Já em 2024, o Contran revisou e atualizou as normas anteriores, trazendo ajustes importantes para o funcionamento do sistema. Entre as principais mudanças, destacam-se:
- A cobrança proporcional à distância percorrida;
- A ampliação do prazo de pagamento, que passou de 15 para 30 dias após a passagem pelo pórtico;
- A centralização das informações de cobrança em um único ambiente digital, além da Carteira Digital de Trânsito (CDT);
- A padronização da sinalização viária, com novas placas e símbolos que indicam claramente os trechos onde o sistema de livre passagem está em operação.
Qual a relação do free flow com as concessões rodoviárias?
A implementação do pedágio free flow está diretamente ligada ao modelo de concessões rodoviárias no Brasil. Isso porque são as concessionárias — empresas privadas responsáveis pela administração e manutenção das rodovias — que detêm a autorização para instalar, operar e gerenciar os sistemas de cobrança eletrônica.
O Governo Federal, por meio da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), estabelece as diretrizes gerais e os marcos regulatórios, enquanto as concessionárias executam o projeto conforme os contratos de concessão.
Dessa forma, o free flow é incorporado aos planos de modernização e investimento exigidos nos editais das novas concessões, com o objetivo de melhorar a fluidez do tráfego, reduzir custos operacionais e oferecer mais comodidade aos usuários.
Você também pode se interessar: Documentos do carro: o que não pode faltar?
Pedágios free flow em operação no Brasil
A tecnologia free flow está se expandindo pelo Brasil, com diversos pontos já ativos e concentrados em estados que possuem rodovias sob concessão. O Rio de Janeiro foi o palco da ativação inicial do sistema no país, em 2023, com a ativação dos primeiros pórticos pela CCR RioSP na Rodovia BR-101 (Rio-Santos).
As estruturas estão instaladas em três trechos: Itaguaí (km 414), Mangaratiba (km 447) e Paraty (km 538) — marcos inaugurais da tecnologia em território nacional.
São Paulo, por sua vez, apresenta a maior concentração e expansão do sistema no país, com a tecnologia sendo implementada em diferentes rodovias estaduais e federais. O sistema já está em funcionamento em importantes eixos rodoviários, como a Rodovia Raposo Tavares (SP-270), a Rodovia dos Tamoios, trechos da BR-116 (incluindo áreas da Região Metropolitana de São Paulo) e da Rio-Santos.
As implementações mais recentes contemplam as rodovias Mogi-Dutra (SP-088), Mogi-Bertioga (SP-098) e Padre Manoel da Nóbrega (SP-055).
Implementações fora do eixo Rio-São Paulo
No Rio Grande do Sul, a concessionária CSG (Caminhos da Serra Gaúcha) lidera o processo, operando seis pontos de cobrança automática nas regiões da Serra e do Vale do Caí. Entre os principais trechos estão a ERS-122, com pórticos em São Sebastião do Caí (km 4) e Farroupilha (km 45), além de outras rodovias integradas ao sistema.
Em Minas Gerais, o destaque fica por conta da Rodovia MG-459, onde foi implantado o primeiro ponto de cobrança sem cancela do estado, localizado no km 12,7, em Monte Sião.
Em outros estados, o sistema ainda está em fase de planejamento, testes ou processo de implementação. No Paraná, por exemplo, a tecnologia dos free flow já está em fase de testes em trechos da rodovia BR-277.
Cenário de implantação e tendências para os próximos anos
Em maio, durante o III Summit de Concessões de Rodovias, o Ministério dos Transportes anunciou uma previsão de mais de R$ 120 bilhões em investimentos em concessões rodoviárias, com leilões programados para 2025 e 2026. Dentro desse amplo pacote de modernização da malha viária nacional, o modelo de pedágio free flow aparece como uma das principais apostas.
Atualmente, o sistema vem ganhando espaço de forma gradual, porém consistente, nas rodovias brasileiras. Desde sua autorização legal em 2021 e a primeira regulamentação técnica em 2022, o free flow vem sendo implantado em projetos-piloto e hoje já conta com dezenas de pontos em operação.
Tanto a ANTT quanto governos estaduais já planejam expandir significativamente o número de pórticos de livre passagem. De acordo com a Fetrabens (Federação das Empresas de Transporte de Cargas do Estado de São Paulo), até 2030 o estado paulista poderá contar com mais de 50 pontos de pedágio eletrônico no modelo free flow, integrados aos contratos das novas concessões rodoviárias.
A tendência é que o sistema de pedágio em fluxo livre se consolide como padrão nas futuras concessões. Contudo, ainda restam dúvidas e controvérsias sobre o caminhar para essa nova realidade.
Leia também: Hora de pensar em IPVA e IPTU: pagar à vista ou parcelar?
Riscos e desafios do pedágio free flow
Como ocorre em praticamente toda inovação baseada em avanços tecnológicos, a consolidação do free flow enfrenta desafios significativos, que vão desde questões de infraestrutura e regulamentação até a adaptação do comportamento dos usuários.
Ainda em 2021, no marco regulatório, o Instituto Brasil Logística (IBL) publicou uma nota técnica que destacava alguns riscos operacionais do sistema.
Entre as preocupações levantadas estavam a dificuldade em paralisar a cobrança em caso de falhas técnicas na rodovia, e o desafio de coibir efetivamente as infrações e a má-fé dos usuários, dada a ausência de barreiras físicas.
Aderência e inadimplência dos usuários
A principal questão atual na análise de muitos é a baixa taxa de adesão às tags de cobrança automática:
- Uma pesquisa da FSB de 2024 indicou que mais de 25% dos motoristas brasileiros ainda não utilizam nenhum método de cobrança automática.
- A baixa adesão às tags obriga o sistema a depender da leitura da placa para a cobrança, tornando o processo mais complexo e suscetível à inadimplência.
Conforme o especialista em infraestrutura Fernando Vernalha, “o sucesso do free flow depende da criação de mecanismos claros que incentivem o pagamento da tarifa, já que não existe uma barreira física que impeça a passagem do veículo”, disse.
Debates Jurídicos
A possibilidade de multa por falta de pagamento e o risco de superendividamento têm gerado debate de natureza jurídica. Recentemente, o Ministério Público Federal (MPF) chegou a mover uma ação para questionar a aplicação de multas por falta de pagamento em um sistema de cobrança eletrônica na Via Dutra (BR-116), em trechos de intenso tráfego local na Grande São Paulo.
O MPF argumenta que, em certos contextos, o sistema eletrônico não possui natureza de pedágio (que angaria recursos para a manutenção da via), mas sim de um serviço alternativo para evitar congestionamentos.
Segundo o MPF, a cobrança das tarifas deve ser tratada como uma relação de consumo entre o motorista e a concessionária, regida pelo Código de Defesa do Consumidor e o Código Civil, e não pelas leis de trânsito. A aplicação de multas, nesse caso, é vista pelos promotores como inconstitucional, pois geraria o risco de superendividamento.
Este conteúdo foi útil? Siga o Melhor Investimento nas redes sociais: