Os dados mais recentes da Pnad Trimestral, divulgados pelo IBGE na última sexta-feira, mostram que o mercado de trabalho brasileiro ainda está aquecido, apesar das altas taxas de juros e das políticas monetárias contracionistas do Banco Central. Com algumas regiões do Brasil apresentando taxas de desemprego abaixo de 3%, a situação mostra que a recuperação do mercado de trabalho continua, impulsionada por uma série de fatores, como a alta taxa de ocupação, que tem se mantido em níveis históricos em diversos estados do país. O economista Fernando Holanda Barbosa Filho, da FGV Ibre, analisou os dados e compartilhou suas perspectivas sobre o cenário econômico atual e futuro.

O que está por trás do mercado aquecido?

A taxa de desemprego no Brasil, que tradicionalmente tem sido um dos principais indicadores de saúde econômica, está apresentando sinais de recuperação em algumas regiões. No entanto, o especialista aponta que o nível de ocupação — que é a razão entre o número de pessoas ocupadas e aquelas em idade de trabalhar — é um indicador mais preciso para medir a real situação do mercado. Em 2024, a taxa de ocupação média anual foi de 58,6%, com destaque para estados como Mato Grosso, Santa Catarina e Goiás, que registraram índices de 68,4%, 67% e 65,3%, respectivamente. Esses números, que estão perto de seus picos históricos, sugerem uma sólida recuperação da força de trabalho em várias partes do país.

O nível de ocupação

O nível de ocupação, segundo Barbosa Filho, é uma métrica mais confiável para analisar o aquecimento do mercado de trabalho, pois não depende da participação das pessoas ativamente procurando emprego. Em algumas regiões, principalmente no Nordeste, a redução do desemprego pode ser explicada pela diminuição do número de pessoas buscando trabalho, após a ampliação de programas de benefícios. Em contrapartida, o nível de ocupação reflete a real movimentação do mercado de trabalho, revelando que a ocupação em muitos estados segue em crescimento.

Barbosa Filho observa que a recuperação da taxa de ocupação é um reflexo do aumento da demanda por trabalho, mas alerta que a política de juros altos do Banco Central poderia afetar essa tendência. A política monetária contracionista normalmente leva a uma desaceleração econômica, o que em muitos cenários resulta em aumento do desemprego.

Juros altos e seus efeitos no mercado de trabalho

A questão que se coloca, segundo o economista, é que, apesar da política monetária do Banco Central, que objetiva conter a inflação, ainda não é possível prever com certeza qual será o impacto total dessa estratégia sobre o mercado de trabalho. Em modelos econômicos convencionais, juros mais altos geralmente têm o efeito de desaquecer a economia, o que, por sua vez, poderia aumentar o desemprego. Contudo, Barbosa Filho destaca que a ação do governo federal com estímulos econômicos, como a implementação de programas de incentivo, pode atenuar esses efeitos e impulsionar o crescimento do mercado de trabalho, mesmo com a Selic em níveis elevados.

O papel da renda na estabilidade do mercado de trabalho

Um dos próximos pontos a serem observados no cenário econômico, conforme destaca o especialista, será a renda dos trabalhadores. Se, nas próximas edições da Pnad, houver um sinal de queda na renda, isso poderia ser interpretado como um indicador de desaceleração do mercado de trabalho. Atualmente, a renda no Brasil tem crescido acima da produtividade, o que indica que o mercado de trabalho ainda está aquecido, mas com reflexos inflacionários. Essa dinâmica está diretamente ligada ao aumento do custo de vida e aos desafios econômicos enfrentados pelas famílias brasileiras.

Desaceleração é possível, mas não esperada de forma rápida

Apesar das previsões de que a política de juros altos poderia frear a economia e impactar negativamente o mercado de trabalho, Barbosa Filho não espera uma queda drástica no desemprego. A desaceleração do mercado de trabalho, embora esperada, não deve ocorrer de forma abrupta. O economista aponta que, em 2024, o mercado de trabalho continuará apresentando uma taxa de ocupação elevada, com uma possível estabilização no final do ano.