Em 1º de novembro, o dólar fechou no segundo maior valor nominal da história, cotado a R$ 5,86, ficando atrás apenas da cotação do dia 14 de maio de 2020, quando a pandemia da COVID-19 se alastrava pelo mundo e a moeda então atingiu R$ 5,93. No acumulado de 2024, o dólar já subiu 20,96%.

Diversos fatores influenciaram esse aumento recente, como a incerteza fiscal no Brasil, a vitória do então candidato à presidência dos EUA, Donald Trump, queda das commodities como minério de ferro, entre outros fatores. Diante de tantas variáveis, o dólar por ser uma moeda considerada “forte” em momentos de tensão mundial, valoriza-se e há um fluxo maior de compradores, ocasionando o aumento da cotação.

Vale ressaltar que o real é a 5ª moeda que mais se desvalorizou no ano, ficando à frente até mesmo do peso argentino, em um país que atualmente sofre com uma inflação acima de 200% ao ano. 

Confira o ranking das piores moedas do mundo em 2024:

  • 1° – Naira (Nigéria): -41,3%
  • 2°- Libra (Egito): -35,2%
  • 3° – Libra sudanesa (Sudão do Sul): -29,9%
  • 4° – Cedi ganês (Gana): -20,9%
    5° – Real (Brasil): -11,4%
  • 6° – Peso (Argentina): -10,8%
  • 7° – lene (Japão): -10.4%
  • 8° – Lira turca (Turquia): -9,2%
  • 9° – Peso (México): – 7,9%
  • 10° – Peso (Colômbia): -7,1%

Mas afinal, como o valor do dólar pode impactar sua vida e seu cotidiano?

Vamos então à lista:

10 – Combustível

O preço da gasolina e outros derivados do petróleo são cotados em dólar. Esse aumento reflete no valor do transporte público, transporte privado, valores de viagens em aplicativos de transporte de passageiros, fretes, transporte de mercadorias e consequentemente, ocasionando um aumento generalizado de todos os itens que precisam de transporte terrestre. Vale ressaltar que a gasolina subiu 7,3% nos últimos 12 meses, e o diesel comum 7,9%.

9 – Passagens aéreas

O querosene de aviação (QAV) é um dos principais custos das companhias aéreas, chegando a 30% de todo o custo operacional e tem forte influência da variação cambial. Além disso, diversos outros custos são dolarizados, como seguros, manutenção e arrendamentos, que somam em média, 20% dos custos da companhia aérea. 

A título de curiosidade, as aeronaves comerciais não são de propriedade (em sua maioria) das companhias aéreas, elas são fruto de uma transação chamada leasing, ou arrendamento mercantil como é conhecido no Brasil. Esse contrato é firmado com indexação ao dólar, ou seja, sofre a variação cambial de acordo com o mercado.

8 – Eletrônicos

Grande parte dos aparelhos de smartphone, aparelhos de internet como modens e roteadores, notebooks, computadores e tablets têm produção ou componentes fora do Brasil. A título de comparação, o iPhone 16 chegou ao Brasil com o preço de R$ 8.299,00, e saltou esses últimos meses para R$ 9.499,00, um aumento de 14,4%.

7 – Medicamentos

95% dos insumos utilizados para fabricação de medicamentos no Brasil, são importados, especialmente da Índia. Medicamentos para o aparelho geniturinário e reprodutivo tiveram aumento de 5,49% somente em agosto, seguido pelos medicamentos do aparelho digestivo e metabolismo com aumento de 4,37% segundo o IPM-H (índice de preços de medicamentos para hospitais). Os medicamentos representam 3% de todas as importações brasileiras, o equivalente a US$ 5,4 bilhões.

6 – Pães e massas

O Brasil é um grande importador de trigo, e inclusive no período de 2023/24 houve aumento de 50% no volume de importações. O principal exportador de trigo para o Brasil é a Argentina. De janeiro a agosto de 2024, o Brasil importou 4,556 milhões de toneladas de trigo, o maior volume para o período desde 2020. Esse valor é 9% superior ao total importado em 2023.

5 – Carne

O preço das carnes deve subir até 16,1% em 2025. Se confirmado, será o maior aumento em cinco anos: em 2020, foi de 17,97%. Esse aumento é influenciado tanto pela variação cambial quanto pela diminuição da demanda. Com a valorização do dólar, é mais vantajoso para o produtor de bovinos, exportar a carne do que comercializar no mercado interno, o que reflete negativamente nos preços para os consumidores do Brasil.

4 – Veículos 

A influência do dólar nas operações do mercado automotivo brasileiro se deve à dependência de componentes importados. Mesmo veículos produzidos localmente incorporam peças estrangeiras em sua composição, como motores e itens de tecnologia.

Os veículos de luxo e os que possuem maior tecnologia são os que mais contém componentes importados, o que influencia diretamente no valor final. Também sofrem aumento expressivo de preço os veículos elétricos e híbridos, que possuem praticamente todos os componentes importados.

Em relatoria da consultoria “Jato Dynamics” o preço dos veículos novos aumentou 90% nos últimos 6 anos. A crise dos microchips e semicondutores também ocasionou valorização destes componentes, que são importados, ocasionando aumento do preço final que é consequentemente repassado ao consumidor.

3 – Papel higiênico

A celulose, principal matéria-prima do produto, teve o seu preço aumentado repetidas vezes nos últimos 2 anos. Além disso, o insumo é comercializado em dólar. No ano de 2023, o papel higiênico teve aumento de 14%. Com esse novo patamar de preços do dólar, há risco de desabastecimento nas famílias mais carentes. Segundo o IBGE, o papel higiênico foi o item da cesta básica que mais aumentou de 2022 até 2024.

2 – Fertilizantes

Os preços dos fertilizantes mais utilizados na agricultura brasileira tiveram alta de mais de 200% nos últimos nove anos e tem impactado diretamente nos custos da produção agrícola do país, segundo os dados do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea-Esalq/USP). 

A título de exemplo, o Cloreto de Potássio (KCL) em 2021 custava U$ 250,00 por tonelada. Hoje, em novembro de 2024 está cotado a U$ 400,00 por tonelada. Esse aumento de preços de fertilizantes onera muito o custo operacional do produtor rural, e que é consequentemente repassado ao consumidor final, ocasionando aumento generalizado dos preços dos alimentos. O comércio desses produtos movimentou, até o momento, o valor de US$ 8,4 bilhões.

1 – Construção civil

A construção civil é um dos setores mais afetados pelo dólar, pois usa materiais importados e commodities como o minério de ferro. Quando o dólar sobe em relação ao real, o custo da construção tende a aumentar. 

O Índice Nacional da Construção Civil (Sinapi) apresentou um aumento de 0,41% em abril de 2024, a maior taxa desde setembro de 2022. O acumulado nos últimos 12 meses atingiu 2,51%. Mesmo os materiais produzidos no Brasil podem sofrer reajustes, pois podem ser utilizados componentes importados para sua fabricação.

Segundo dados da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), cerca de 80% dos insumos utilizados no setor são produzidos no Brasil. No entanto, os 20% restantes, que incluem itens como elevadores, sistemas de ar condicionado e alguns tipos específicos de aço, são diretamente afetados pelas variações cambiais.

A dependência do Brasil pelas importações

Com todos estes dados, fica claro a dependência do Brasil de produtos importados para alimentar toda sua cadeia produtiva e dar fluidez à economia. O atraso tecnológico do Brasil impede o beneficiamento de grande parte do petróleo extraído do nosso solo, assim como impede o beneficiamento de grande parte do minério de ferro que exportamos, em especial para a China. 

A forte desvalorização do real frente ao dólar impede uma competição justa de mercado com outros países. A falta de ancoragem fiscal impede o fluxo de capital estrangeiro para nossas fronteiras. 

Gráfico do dólar x real: 17,40% de 1º de janeiro até 07 de novembro.

O Brasil tem grande capacidade produtiva, agricultura pujante, pecuária robusta e grande diversidade de minério e outros insumos desejados pelas grandes potências mundiais, porém para um perfeito equilíbrio econômico, é essencial uma diminuição da disparidade do real frente ao dólar, que hoje é, e será indefinidamente, a moeda mais forte do planeta. 

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Joao Victor Capatto Rabelo

João Victor Capatto Rabelo é sócio e assessor de investimentos na InvestSmart. Médico veterinário por formação, atuou na área por 8 anos antes de fazer a transição de carreira. Suas áreas de interesse incluem finanças e, especialmente, criptoativos. Tem um apego especial à educação financeira e como objetivo de vida, ajudar as pessoas a entenderem sobre o mercado financeiro.