Natura &Co: conheça a empresa e o histórico de aquisições e recuos
Veja a trajetória da Natura &Co, suas aquisições globais, desinvestimentos e as lições para investidores e empresas.

A Natura &Co é um exemplo de como empresas latino-americanas podem ganhar protagonismo global, mas também de como a complexidade e os riscos da internacionalização podem impactar o desempenho no longo prazo.
Nas últimas duas décadas, a companhia construiu uma trajetória de expansão ousada, que incluiu aquisições bilionárias de marcas icônicas do setor de cosméticos, como Aesop, The Body Shop e Avon.
No entanto, nos últimos anos, vimos um processo de desinvestimento estratégico, em que a empresa abriu mão de parte de seus ativos globais para simplificar sua estrutura e recuperar rentabilidade.
No Melhor Investimento, vamos aprofundar o histórico da Natura, suas aquisições mais marcantes, os recuos recentes e as lições que ficam para investidores e empresários.
Breve histórico da Natura
Fundada em 1969 pelo economista Luiz Seabra, em São Paulo, a Natura nasceu como uma pequena loja de cosméticos e perfumes.
Desde o início, a empresa se diferenciou pelo foco em ingredientes naturais e pelo atendimento consultivo, que depois evoluiria para seu modelo consagrado de vendas diretas.
Nos anos 1980 e 1990, a empresa se consolidou no mercado brasileiro e começou a expandir para países da América Latina, como Argentina, Chile e Peru.
A marca conquistou consumidores pela combinação de propósito socioambiental, produtos de qualidade e forte engajamento de suas consultoras.
Já nos anos 2000, a Natura abriu capital na B3 (NTCO3), atraindo investidores interessados em seu modelo de negócio escalável e em sua forte presença no setor de beleza e bem-estar.
O passo seguinte seria ousado: tornar-se uma multinacional global, capaz de disputar espaço com gigantes como L’Oréal, Estée Lauder e Shiseido.
A ofensiva global: de Aesop à Avon
A partir de 2012, a Natura embarcou em um processo agressivo de internacionalização, apostando em aquisições de marcas consolidadas.
2012 – Aesop: o primeiro passo internacional
A compra de 65% da australiana Aesop, em 2012, marcou a estreia da Natura em aquisições globais. A marca, criada em 1987 por Dennis Paphitis, se destacava pelo design minimalista e produtos de alta qualidade baseados em óleos essenciais.
O investimento foi considerado estratégico: a Aesop tinha forte apelo em mercados sofisticados e serviu como “cartão de visita” para a Natura fora da América Latina.
Em 2016, a Natura comprou os 35% restantes da marca, assumindo controle total. Sob sua gestão, a Aesop se expandiu de forma acelerada, chegando a mais de 400 lojas em 29 países.
Esse sucesso permitiu uma venda bilionária em 2023: a L’Oréal adquiriu a marca por US$ 2,5 bilhões. Foi um dos maiores acertos da história da Natura, pois a operação valorizou de forma expressiva em relação ao aporte inicial.
2017 – The Body Shop: diversificação no varejo físico
O segundo grande movimento veio em 2017, com a compra da britânica The Body Shop, então pertencente à L’Oréal, por 1 bilhão de euros.
A aquisição reforçava a estratégia de internacionalização e diversificação, aproveitando uma marca com presença global e histórico de ativismo ambiental.
No entanto, os desafios eram grandes: a The Body Shop já enfrentava queda nas vendas, forte concorrência e dificuldades de reposicionamento no varejo.
Apesar da sinergia de propósito com a Natura, a operação não trouxe os resultados esperados.
Em 2023, a empresa brasileira vendeu a marca para o fundo Aurelius por apenas US$ 254 milhões, acumulando prejuízo relevante. A venda foi considerada necessária para reduzir complexidade e focar em mercados mais rentáveis.
2019/2020 – Avon: a grande aposta global
A mais ousada de todas as aquisições foi a da americana Avon Products, anunciada em 2019 e concluída em 2020. O negócio envolveu cerca de US$ 2 bilhões, resultando na criação da holding Natura &Co.
Com a fusão, a empresa brasileira passou a controlar quatro grandes marcas (Natura, Avon, Aesop e The Body Shop), presentes em mais de 100 países e com faturamento anual superior a US$ 10 bilhões.
Naquele momento, a Natura se tornava o quarto maior grupo de beleza do mundo, atrás apenas de L’Oréal, Estée Lauder e Shiseido.
Mas, apesar do simbolismo da operação, integrar uma multinacional centenária com dificuldades estruturais se mostrou mais complicado do que o esperado.
Do auge ao recuo: a desmontagem da estratégia global
Poucos anos depois de alcançar seu ápice em escala global, a Natura começou a enfrentar sérios desafios operacionais e financeiros.
- A pandemia de Covid-19 impactou fortemente o setor de beleza, reduzindo vendas presenciais e acelerando a digitalização, um processo no qual a Avon estava atrasada.
- As marcas adquiridas exigiam investimentos altos, mas não entregavam resultados na velocidade necessária.
- A dívida da companhia aumentava, e a rentabilidade caía.
Diante disso, a empresa iniciou um ciclo de desinvestimentos estratégicos, desmontando parte da estratégia global:
- Aesop (2023): vendida à L’Oréal por US$ 2,5 bilhões.
- The Body Shop (2023): vendida ao fundo Aurelius por US$ 254 milhões.
- Avon International (2025): vendida ao fundo Regent por 1 libra esterlina.
A venda da Avon International, que incluía operações na Europa, Ásia e Oceania, foi simbólica. Apesar do valor irrisório, o mercado reagiu positivamente: as ações da Natura subiram mais de 16% na B3 no mesmo dia do anúncio.
Isso porque a operação representava o fim de um ciclo de queima de caixa. Somente em um semestre, a Avon Internacional havia consumido mais de US$ 1 bilhão.
A valorização recente das ações da Natura
Apesar de vender ativos por valores simbólicos, a Natura conseguiu recuperar a confiança do mercado.
De acordo com analistas da XP Investimentos e da Levante Corp, os investidores interpretaram o movimento como um ato de disciplina financeira e clareza estratégica.
Em vez de insistir em manter negócios deficitários, a empresa optou por simplificar sua estrutura e concentrar esforços em sua principal fortaleza: a América Latina.
Esse foco deve permitir:
- Redução de endividamento;
- Maior previsibilidade de resultados;
- Sinergias entre Natura e Avon na região, aproveitando a força da rede de consultoras.
Por que as aquisições não deram certo?
Ao analisar os movimentos da Natura, alguns pontos se destacam. As avaliações elevadas das aquisições, realizadas em ciclos de alta de mercado, fizeram com que a empresa pagasse caro por marcas como The Body Shop e Avon, que acabaram entregando resultados abaixo do esperado.
Além disso, a integração cultural mostrou-se complexa, já que cada marca possuía identidade própria, processos e culturas distintas, dificultando a captura de sinergias.
A pandemia também teve forte impacto, afetando o setor de cosméticos com a queda no consumo presencial e prejudicando os modelos de venda direta.
Por fim, a queima de caixa contínua, especialmente no caso da Avon, evidenciou que os custos de manutenção superaram os benefícios esperados.
Implicações e lições para investidores e empresários
A trajetória da Natura deixa várias lições relevantes:
- Crescimento global exige preparo estrutural: não basta comprar marcas consolidadas; é necessário ter musculatura operacional e financeira para integrá-las.
- Desinvestimentos podem ser estratégicos: vender ativos deficitários não é apenas reconhecer falhas, mas também proteger o futuro da companhia.
- O mercado valoriza foco e clareza: investidores preferem empresas que priorizam rentabilidade e simplicidade àquelas que apostam em expansão desordenada.
- Estrutura de holding precisa ser sustentável: manter marcas em diferentes regiões só faz sentido quando há geração de caixa consistente para sustentar a complexidade.
O futuro da Natura &Co
Agora, a Natura segue um caminho de foco regional, concentrando-se na América Latina, onde sua presença é sólida e competitiva. O plano é:
- Reforçar canais digitais e modernizar o modelo de venda direta;
- Aproveitar a força da marca Natura, que lidera em inovação e sustentabilidade;
- Extrair sinergias com a Avon Latam, que ainda possui base ampla de consultoras e consumidores.
Para analistas, esse reposicionamento tende a tornar a empresa mais previsível e atraente para investidores, mesmo que com ambições globais mais modestas.
A Natura &Co protagonizou uma das histórias mais ousadas da economia brasileira: comprou marcas icônicas, tornou-se a quarta maior empresa global do setor de beleza e, poucos anos depois, precisou recuar.
Para investidores, a mensagem é clara: nem sempre crescer significa ganhar. O aprendizado da Natura mostra que, em alguns casos, recuar é uma forma inteligente de avançar, especialmente quando se trata de proteger caixa, simplificar estruturas e retomar rentabilidade.
Hoje, com foco na América Latina, a Natura mostra resiliência e capacidade de adaptação. Essas são qualidades que, no longo prazo, podem se revelar mais valiosas do que qualquer expansão apressada.
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