Decisão do STF sobre redes sociais deve aumentar judicialização da internet, alerta especialista
A decisão do STF que amplia a responsabilidade das redes sociais pelo conteúdo publicado por terceiros pode aumentar a judicialização da internet no Brasil.

A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre redes sociais, que amplia a responsabilidade das plataformas pelo conteúdo publicado por terceiros, deve resultar em um aumento significativo da judicialização na internet brasileira, segundo o advogado e diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade (ITS), Ronaldo Lemos. A medida, considerada uma mudança importante no Marco Civil da Internet, altera a forma como conteúdos são removidos e como a liberdade de expressão é protegida no ambiente digital.
Ampliação da responsabilidade das redes sociais e a inversão do Marco Civil
Até recentemente, o regime estabelecido pelo Marco Civil da Internet protegia a liberdade de expressão ao garantir que conteúdos denunciados permanecessem no ar até que o judiciário decidisse sobre sua legalidade. Conforme explicou Ronaldo Lemos, “quando alguém reclamava de um conteúdo, a Justiça analisava se ele era ilícito e, somente então, emitia uma ordem para que a plataforma removesse o conteúdo. Caso a plataforma descumprisse, ela passava a ser responsabilizada”.
No entanto, a decisão do STF inverteu essa lógica. Agora, em três dos quatro regimes criados, a regra é que o conteúdo denunciado seja removido imediatamente pelas redes sociais, cabendo ao autor recorrer à Justiça para reverter a remoção, caso considere que ela foi injusta. Isso significa que o conteúdo pode ficar fora do ar mesmo antes de uma avaliação judicial definitiva, o que pode impactar diretamente a liberdade de expressão dos usuários.
Impactos para a liberdade de expressão na internet
Ronaldo Lemos ressaltou que essa inversão no procedimento é preocupante porque coloca o ônus da prova e da ação nas mãos do usuário que teve seu conteúdo removido. “Quando você posta alguma coisa e a plataforma tira do ar, você vai ter que brigar sozinho para fazer valer seu direito de liberdade de expressão. Enquanto isso, aquilo que você postou fica fora do ar”, afirmou o especialista.
Essa nova dinâmica pode transformar o ambiente digital em um “jogo de tira e põe”, onde conteúdos serão retirados e, posteriormente, demandarão disputas judiciais para voltar ao ar. A consequência direta disso, segundo Lemos, é a intensificação da judicialização no país, com aumento do volume de processos relacionados a conteúdos digitais.
Judicialização da internet: um cenário em expansão
Com a ampliação da responsabilidade das redes sociais, a tendência é que o número de ações judiciais aumente significativamente. Segundo o diretor do ITS, essa mudança na interpretação do Marco Civil trará mais processos e disputas na Justiça envolvendo a remoção de conteúdos, o que pode sobrecarregar o sistema judiciário e gerar insegurança para os usuários e para as plataformas.
Esse cenário reforça a necessidade de um debate amplo sobre como equilibrar a proteção da liberdade de expressão com o combate a conteúdos ilegais ou nocivos na internet. Enquanto o modelo anterior garantia o acesso contínuo à informação até decisão judicial, o novo regime dá prioridade à remoção preventiva, com consequências ainda pouco dimensionadas.
Como funcionava o modelo anterior e o que muda com a decisão do STF
O Marco Civil da Internet, que rege a atuação das plataformas digitais no Brasil, previa que elas só seriam responsabilizadas se desobedecessem a uma ordem judicial para remoção de conteúdo. Isso assegurava que a liberdade de expressão fosse preservada até o julgamento definitivo da Justiça.
Com a decisão recente do STF, essa lógica mudou. Agora, o conteúdo denunciado deve ser retirado de imediato pela plataforma, e o responsável pelo conteúdo removido deverá recorrer ao Judiciário para restabelecer o material, se assim desejar. Essa mudança coloca em evidência o papel das plataformas digitais como árbitros iniciais do que pode ou não permanecer disponível na internet.
Declarações no programa Poder e Mercado
As análises de Ronaldo Lemos foram dadas durante entrevista ao programa Poder e Mercado, exibido às terças e quintas-feiras, às 20h, no Canal UOL. O programa aborda temas de política e economia, conectando as decisões do Congresso Nacional e do Judiciário aos impactos no mercado financeiro e na vida dos brasileiros. A apresentação é feita por Raquel Landim, com comentários dos especialistas Mariana Barbosa e Graciliano Rocha.