Apesar de o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) dos Estados Unidos (EUA) ter desacelerado no primeiro trimestre de 2024 – o dado registrou uma alta anualizada de 1,6% em comparação com a variação de 3,4% no último trimestre do ano passado -, o núcleo da inflação medido pelo Índice de Preços ao Consumidor (PCE) veio acima das expectativas. Isso tende a manter os economistas desanimados em relação à possibilidade de o Federal Reserve realizar cortes nas taxas de juros no curto prazo.

A secretária do Tesouro dos EUA, Janet Yellen, buscou minimizar a surpresa em relação aos preços. Segundo ela, o progresso na redução da inflação não foi comprometido nos primeiros três meses do ano. Yellen expressou a convicção de que não será necessário que outras áreas da economia, como o mercado de trabalho, enfraqueçam para que a inflação retorne à meta de 2% estabelecida pelo Fed. “Para mim, os dados indicam que estamos em uma trajetória descendente em relação à inflação”, afirmou.

Além disso, Yellen optou por ressaltar a robustez dos gastos do consumidor e dos investimentos no trimestre. “Esses dois elementos da demanda final estiveram em linha com a taxa de crescimento do ano passado. Portanto, essa é a força subjacente da economia dos EUA, que demonstrou uma contínua robustez e um funcionamento pleno da economia”, enfatizou.

Análises do mercado

A economista do C6 Bank, Claudia Rodrigues, ressalta que, apesar do Produto Interno Bruto (PIB) ter ficado aquém das expectativas do mercado (2,5%), a composição do indicador ainda evidencia a manutenção da robustez tanto do consumo das famílias quanto dos investimentos.

“Evidentemente, embora a produção econômica tenha sido menor no período, o consumo interno nos EUA permanece vigoroso. Uma possível explicação para isso é a substituição do consumo de produtos domésticos por importados, considerando a atual valorização global do dólar”, explica Rodrigues.

Rodrigues destaca ainda outro dado relevante divulgado hoje: o núcleo do Índice de Preços ao Consumidor (PCE), calculado pelo Departamento de Comércio. “O índice (3,7%) superou as projeções do mercado (3,4%) e do período anterior (2,0%), indicando que os preços continuam sob forte pressão”, acrescenta.

Nesse contexto, Claudia observa que, apesar de o Federal Reserve ter indicado na última reunião a possibilidade de três cortes de juros até o final de 2024, agora há uma maior probabilidade de que não ocorra nenhuma redução das taxas de juros neste ano.

Por sua vez, Leonardo Costa, economista do ASA Investments, interpreta a surpresa de alta no Índice de Preços ao Consumidor (PCE) como um sinal de resistência no núcleo da inflação. Ele ressalta, no entanto, que ainda não é possível determinar se essa surpresa decorre de revisões nos dados de janeiro ou fevereiro, dado que a divulgação é trimestral.

“De maneira geral, o crescimento do PIB mostra um ritmo mais fraco no consumo e nos gastos do governo. E, em relação à inflação, há uma resistência na desaceleração dos núcleos”, afirma Costa, destacando que alcançar o que é conhecido como a “última milha” é uma tarefa desafiadora, especialmente em um cenário de pressão inflacionária nos Estados Unidos.

Sinais contraditórios

Danilo Igliori, economista-chefe da Nomad, avalia que as primeiras estimativas do Produto Interno Bruto (PIB) para o primeiro trimestre de 2024 nos Estados Unidos trouxeram sinais contraditórios. “Por um lado, o indicador de atividade aponta para uma desaceleração considerável em comparação com o final do ano passado. Por outro lado, os números da inflação presentes no relatório são robustos e aumentam as incertezas em relação às perspectivas para o início do ciclo de cortes nas taxas de juros”, explica.

Ele alerta que, no limite, esse cenário levanta preocupações sobre a possibilidade de estagflação. “Os principais índices do mercado de ações dos EUA caíram após a divulgação, pressionados também por respostas a resultados corporativos e orientações de grandes empresas.”

Diante disso, Igliori destaca que todas as atenções agora se voltam para a divulgação do Índice de Preços ao Consumidor (PCE) amanhã. “Se o PCE de março indicar uma trajetória de inflação em direção à meta de 2%, o discurso pode perder parte de sua tonalidade ‘hawkish’ recentemente adotada. Por outro lado, se os números apontarem para uma pressão inflacionária contínua, as esperanças de cortes nas taxas de juros em 2024 sofrerão outro revés. A única certeza neste momento é que não faltarão emoções nos dias que antecedem a próxima reunião do Comitê Federal de Mercado Aberto (FOMC)”, pondera.

Com Reuters