Encerramento do Drex levanta dúvidas sobre estratégia digital do Banco Central
O encerramento do Drex pelo Banco Central interrompe uma das principais iniciativas brasileiras de moeda digital e tokenização de ativos.
Foto: rafapress/ Shutterstock.com
O encerramento do Drex, moeda digital desenvolvida pelo Banco Central, marca uma inflexão relevante na estratégia brasileira de inovação financeira. O anúncio, feito pelo BC após quase quatro anos de estudos e testes, ocorre em um momento em que moedas digitais de bancos centrais (CBDCs) avançam rapidamente no cenário internacional, levantando preocupações sobre perda de competitividade digital, previsibilidade regulatória e ritmo de inovação no sistema financeiro nacional.
A decisão impacta diretamente bancos, fintechs e empresas de tecnologia financeira que vinham se preparando para operar em um ambiente de liquidação programável e tokenização de ativos. Ao mesmo tempo, reacende o debate sobre como o Brasil pretende se posicionar na próxima geração de infraestrutura financeira global.
Leia também:
Encerramento do Drex e impacto imediato no sistema financeiro
O Banco Central anunciou o encerramento das etapas de desenvolvimento do Drex em 2025, encerrando um projeto iniciado em 2021, quando a iniciativa foi lançada sob o nome de Real Digital. O objetivo era criar uma infraestrutura baseada em tecnologia de registros distribuídos (DLT), permitindo liquidações financeiras instantâneas e seguras, com supervisão regulatória.
O projeto funcionava como um grande laboratório regulado, no qual instituições financeiras testavam modelos de tokenização de ativos, pagamentos contra entrega (DvP) e contratos inteligentes aplicados a crédito, financiamentos e títulos públicos. Com o fim do Drex, essas experiências deixam de contar com um ambiente padronizado e supervisionado pelo BC.
Redução da previsibilidade regulatória e desaceleração da inovação
Especialistas avaliam que o encerramento do Drex reduz a previsibilidade regulatória em um momento decisivo para o setor financeiro. A ausência de um sandbox desse porte tende a frear investimentos em infraestrutura distribuída, já que projetos desse tipo exigem alto grau de segurança jurídica e alinhamento com o regulador.
Segundo analistas, o impacto não significa o fim da agenda de inovação, mas uma desaceleração relevante. Bancos e fintechs que vinham adaptando seus sistemas internos ao modelo de liquidação programável precisarão buscar alternativas menos integradas e, muitas vezes, mais custosas.
O que era o Drex e quais objetivos ficaram pelo caminho
O Drex foi concebido como uma versão digital do real voltada ao atacado, diferente do Pix, que atua no varejo. A proposta envolvia a tokenização de ativos financeiros e reais, permitindo que operações como crédito imobiliário, financiamento de veículos e negociação de títulos ocorressem de forma automatizada e com liquidação quase instantânea.
Os testes buscavam validar interoperabilidade entre instituições, redução de riscos operacionais e maior eficiência na liquidação financeira. Com o encerramento do Drex, essas validações ficam incompletas, e o país perde a chance de liderar a implementação do crédito tokenizado em larga escala.
Impactos diretos para bancos, fintechs e infraestrutura
O fim do projeto afeta especialmente instituições que vinham investindo em adequações tecnológicas para operar em ambientes tokenizados regulados. Sem um padrão definido pelo Banco Central, a tendência é que cada agente busque soluções próprias, o que reduz escala, padronização e eficiência.
Esse cenário também dificulta a integração com outras iniciativas estruturantes, como o Open Finance. A fase mais recente do Open Finance amplia o compartilhamento de dados de investimentos, seguros e câmbio, abrindo espaço para produtos financeiros mais personalizados e automatizados. A conexão com ambientes tokenizados poderia potencializar esses modelos.
Tokenização global avança enquanto o Brasil desacelera
Dados do Bank for International Settlements (BIS) indicam que cerca de 93% dos bancos centrais do mundo já pesquisam, testam ou operam moedas digitais. Países como China, Nigéria, Bahamas e Jamaica já possuem CBDCs em produção. Na OCDE, o Banco Central Europeu avança para a fase de preparação do euro digital, com testes previstos para 2026.
Estimativas do Fundo Monetário Internacional (FMI) apontam que a tokenização pode movimentar mais de US$ 16 trilhões globalmente até 2030. O encerramento do Drex coloca o Brasil em posição mais cautelosa justamente quando essa transformação ganha escala.
Avaliação de especialista sobre os riscos do encerramento
Para Luis Molla Veloso, especialista em Embedded Finance, o Drex cumpria um papel estratégico ao oferecer um ambiente seguro para testes supervisionados. Segundo ele, sem esse espaço, projetos de tokenização tendem a perder velocidade e atratividade.
“O Drex permitia experimentar contratos inteligentes com garantia de liquidação regulada. Sem isso, as instituições terão de recorrer a modelos menos padronizados, o que aumenta custos e riscos”, afirma.
Brasil ainda tem vantagens estruturais, mas precisa de direção
Apesar do encerramento do Drex, especialistas destacam que o Brasil mantém vantagens importantes, como o histórico de inovação do Banco Central com o Pix e o Open Finance. O Pix, por exemplo, já supera R$ 2 trilhões em transações mensais, consolidando-se como uma das maiores plataformas de pagamentos instantâneos do mundo.
A avaliação do mercado é que o país precisa agora apresentar clareza sobre os próximos passos da agenda digital. A ausência de um direcionamento claro pode afastar investimentos justamente quando o sistema financeiro global avança para modelos mais programáveis e interoperáveis.
Gostou deste conteúdo? Siga o Melhor Investimento nas redes sociais: