Apple e Google são alvo de críticas em audiência pública do Cade
Em audiência pública no Cade, representantes de empresas como Apple e Google enfrentaram críticas pesadas de desenvolvedores e fintechs por suas práticas anticompetitivas.

Em uma audiência pública realizada nesta quarta-feira, 19 de fevereiro, em Brasília, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) foi palco de intensas críticas contra as práticas de Apple e Google no mercado de plataformas digitais. Empresas de diversos setores, como a Match Group, dona do Tinder, a Epic Games, criadora do popular jogo Fortnite, e fintechs, expressaram suas preocupações sobre o controle exercido pelas duas gigantes da tecnologia, com foco nas condições impostas nos sistemas operacionais iOS e Android.
O que motivou a audiência do Cade?
A audiência teve como principal objetivo discutir a concorrência no ambiente digital, um tema que tem ganhado relevância devido ao aumento das denúncias de práticas anticompetitivas por parte de grandes empresas do setor. Nos últimos anos, autoridades internacionais aplicaram multas bilionárias contra big techs, e o Cade tem acompanhado de perto essas disputas. O encontro em Brasília trouxe à tona questões como as políticas de pagamentos, taxas abusivas e a falta de flexibilidade nos sistemas operacionais, principalmente no iOS, que é exclusivo para iPhones.
A crítica da Apple: defesa do modelo integrado e segurança
O diretor jurídico da Apple para América Latina e Canadá, Pedro Pace, foi o primeiro a se manifestar durante a audiência. Ele argumentou que a Apple não exerce um controle dominante no mercado, tanto de smartphones quanto na App Store, onde mais de 99% dos aplicativos são de terceiros. Segundo Pace, a empresa garante uma concorrência justa ao oferecer uma plataforma que prioriza a segurança e a privacidade dos usuários.
Pace também alertou sobre os impactos que mudanças regulatórias poderiam ter no setor, citando como exemplo a situação da Europa, onde a Apple enfrentou restrições mais rígidas. Ele sugeriu que o Brasil deveria avaliar cuidadosamente as implicações de seguir um caminho semelhante e, ao mesmo tempo, destacar que o mercado de dispositivos móveis no Brasil é altamente competitivo.
Epic Games e Match Group: desafios para desenvolvedores de apps
- Epic Games: Representada por Mauricio Longoni, a Epic Games não poupou críticas ao modelo de controle exercido pela Apple e Google. Longoni destacou que essas empresas detêm grande poder sobre os dispositivos móveis e impõem taxas e condições prejudiciais aos desenvolvedores, com destaque para as restrições de pagamento impostas pelo iOS. Ele afirmou que o atual ecossistema de aplicativos está comprometido e disfuncional devido ao domínio dessas gigantes.
- Match Group: Priscila Brolio, advogada do Match Group, também expressou seu descontentamento com as práticas da Apple, especialmente no que diz respeito às taxas exorbitantes cobradas pela App Store, que chegam a 30% da receita gerada pelos desenvolvedores de conteúdo digital. Brolio elogiou a decisão do Cade contra a Apple no caso do Mercado Livre, que questionava as restrições de meios de pagamento no iOS. A advogada argumentou que esse tipo de prática prejudica a inovação e impede o aprimoramento de plataformas como o Tinder, que estão atreladas ao ecossistema fechado da Apple.
Fintechs: desafios adicionais impostos pela Apple
Eduardo Lopes, presidente da Zetta, uma associação que reúne fintechs como Nubank, PicPay e Cora, também criticou as práticas da Apple. Ele destacou as dificuldades que as instituições financeiras enfrentam devido às restrições impostas pela Apple, especialmente no uso da tecnologia NFC (pagamentos por aproximação). Segundo Lopes, as fintechs são forçadas a utilizar soluções proprietárias da Apple, o que as coloca em desvantagem frente às soluções abertas oferecidas pelo Android.
Google: defesa de um sistema mais aberto
Por outro lado, o Google foi defendido por Regina Chammam, diretora do Google Play para a América Latina, que ressaltou as vantagens do modelo aberto do Android. De acordo com Chammam, o Android oferece maior flexibilidade para os desenvolvedores, permitindo o uso de lojas de aplicativos alternativas e sistemas de pagamento variados. Ela enfatizou que o Google Play tem contribuído para um mercado competitivo, com uma grande variedade de ofertas e preços mais baixos para os consumidores.
Cade e a possibilidade de regulamentação das plataformas digitais
A audiência também gerou discussões sobre a possibilidade do Cade se tornar um regulador mais ativo para o setor de plataformas digitais, acompanhando uma tendência global de aumentar o controle sobre as big techs. Vicente Bagnoli, professor de Direito da Concorrência da Universidade Presbiteriana Mackenzie, comentou que, embora o Cade já tenha poder para avaliar práticas de abuso de poder dominante, o órgão ainda não tem aplicado grandes decisões no setor. Isso ocorre, segundo ele, porque muitos casos foram arquivados ou considerados insuficientes para uma ação contundente.