A implementação da chamada “taxa das blusinhas”, que desde agosto de 2024 tributa as compras internacionais feitas por brasileiros, tem gerado discussões e impactos significativos no mercado local. Com um aumento na arrecadação fiscal e a queda nas importações, a medida já é considerada um divisor de águas para o comércio eletrônico e a logística no Brasil. O balanço desses seis meses de aplicação da medida traz à tona questionamentos sobre a competitividade do mercado interno e o impacto nos Correios, que enfrentam prejuízos financeiros.

Desde sua implementação, a ‘taxa das blusinhas’ tem mostrado resultados contraditórios. Por um lado, a Receita Federal divulgou um crescimento de 40% na arrecadação sobre as importações, alcançando um recorde de R$ 1,98 bilhão em 2024. Por outro lado, a medida resultou em uma queda de 11% no volume das compras internacionais feitas pelos consumidores brasileiros. A alíquota de 20% para compras de até US$ 50 e de 60% para valores acima desse limite gerou uma mudança significativa no comportamento dos consumidores, que passaram a repensar suas compras de produtos estrangeiros devido ao aumento do custo.

Essa combinação de aumento de arrecadação e diminuição das compras internas está mudando o cenário do comércio eletrônico no Brasil. As varejistas locais passaram a se beneficiar com o crescimento de suas vendas, uma vez que muitos consumidores, diante dos custos adicionais, decidiram optar por produtos nacionais. O reflexo dessa mudança está sendo sentido não apenas pelos compradores, mas também pelas empresas responsáveis pela logística de entregas.

Efeito nos Correios

Os Correios, que são a principal empresa responsável pela entrega de produtos internacionais no Brasil, enfrentaram perdas significativas devido à queda nas importações provocada pela ‘taxa das blusinhas’. A estatal registrou um prejuízo de R$ 3,2 bilhões em 2024, sendo que R$ 2,2 bilhões desse total estão diretamente relacionados à diminuição das remessas internacionais. A redução do volume de encomendas resultou em uma queda no faturamento da empresa, agravando a situação financeira dos Correios.

Além disso, a nova tributação tem causado desafios para a logística interna, com uma sobrecarga nas operações de fiscalização e controle alfandegário. A medida também traz questionamentos sobre a sustentabilidade das operações logísticas no Brasil, já que o aumento dos custos para o consumidor final pode gerar uma diminuição das compras internacionais, afetando diretamente o setor.

Reações dos especialistas

A reação de especialistas sobre os impactos da ‘taxa das blusinhas’ é mista. De um lado, João Henrique Gasparino, sócio do Grupo Nimbus, destaca que a medida trouxe uma alta arrecadação fiscal, mas também gerou efeitos negativos sobre a competitividade do mercado. “Com a alta carga tributária sobre os produtos importados, os consumidores ficaram menos propensos a comprar do exterior, optando por alternativas nacionais. Isso beneficiou as varejistas brasileiras, que passaram a aumentar sua participação de mercado”, afirma Gasparino.

Caio Ruotolo, advogado especializado em direito tributário, concorda com Gasparino e acrescenta que a redução das importações também teve um impacto nas varejistas tradicionais. “A queda nas compras internacionais fez com que as empresas nacionais tivessem uma maior participação no mercado, mas também gerou uma distorção no equilíbrio competitivo”, observa Ruotolo.

Além disso, Ruotolo destaca o impacto negativo nos Correios, que, além de enfrentarem os prejuízos financeiros, estão com uma sobrecarga nos processos de entrega devido ao aumento das operações de fiscalização.

Comparação internacional

Para Vitor Yeung, advogado do escritório Ciari Moreira Advogados, o Brasil adota uma das abordagens mais onerosas para o comércio eletrônico internacional. Yeung faz uma comparação com os Estados Unidos, onde o governo de Donald Trump implementou uma taxa de 10% sobre importações, extinguindo a isenção de US$ 800 para compras internacionais. “No Brasil, os consumidores enfrentam uma carga tributária que pode variar entre 50% e 100%, com o aumento recente do ICMS de 17% para 20%”, comenta Yeung.

Além disso, o advogado aponta que o aumento da alíquota do Imposto de Importação (II), estabelecido pela Lei nº 14.902/2024, provocou uma redução de 38,82% nas Declarações de Importação de Remessas (DIR) e uma queda de 32,73% no volume total de remessas recebidas no país. Essa retração reflete diretamente a diminuição nas compras internacionais, o que impactou negativamente a arrecadação estadual.