Governo planeja cerco a comercialização de criptomoedas
O governo anunciou que pretende lançar ainda este ano um programa destinado a aumentar o controle sobre a comercialização de criptomoedas, como o Bitcoin, no Brasil. A iniciativa está sendo motivada pela regulamentação aplicada nas importações realizadas por plataformas de comércio eletrônico através do programa Remessa Conforme. Lançado no ano passado, o programa que isentou […]

O governo anunciou que pretende lançar ainda este ano um programa destinado a aumentar o controle sobre a comercialização de criptomoedas, como o Bitcoin, no Brasil. A iniciativa está sendo motivada pela regulamentação aplicada nas importações realizadas por plataformas de comércio eletrônico através do programa Remessa Conforme.
Lançado no ano passado, o programa que isentou de taxas de importação produtos declarados de até US$ 50 foi considerado um sucesso pela equipe econômica do governo e servirá como modelo.
Dessa forma, a nova abordagem, apelidada informalmente de “Cripto Conforme”, não incluirá reduções de impostos para as exchanges, como são conhecidas as corretoras de criptomoedas. Em vez disso, o objetivo central é aumentar a visibilidade da Receita Federal sobre as transações com criptoativos realizadas no país, assegurando que os impostos devidos sejam devidamente pagos.
A prestação de informações por parte das plataformas de criptomoedas será fundamental nesse processo. Afinal, mesmo a declaração dessas transações já sendo obrigatória, o governo acredita que algumas empresas, especialmente as que operam sem registro no Brasil, não estão cumprindo essa exigência de forma adequada.
Nesse contexto, parte da estratégia do governo será incentivar corretoras estrangeiras a se registrarem e abrirem operações no Brasil. Aqueles que não aderirem ao programa de regularização enfrentarão uma fiscalização mais rigorosa por parte da Receita Federal, em colaboração com o Banco Central, que é o regulador desse mercado. O monitoramento das operações de empresas estrangeiras também contará com a cooperação internacional, dada a natureza global do problema.
Movimentações de criptoativos
Conforme o Banco Central, a compra líquida de criptoativos por brasileiros atingiu US$ 7,3 bilhões (aproximadamente R$ 40 bilhões) entre janeiro e maio deste ano. Já em 2023, esse montante totalizou US$ 11,2 bilhões (cerca de R$ 61 bilhões).
É importante destacar que o setor de criptoativos, que envolve investimentos em moedas digitais, está sob maior vigilância do Fisco devido ao grande volume de remessas de recursos para o exterior, característico desse mercado.
A Receita Federal vê com preocupação essas operações, pois problemas no cumprimento das obrigações fiscais podem indicar práticas como lavagem de dinheiro.
Isso porque as plataformas estrangeiras que operam no Brasil recebem pagamentos em reais de investidores locais e, em seguida, convertem esse montante para outras moedas antes de enviar os fundos ao exterior para a compra de criptoativos. Normalmente, essas plataformas utilizam uma ou mais instituições de pagamento nacionais para facilitar essa intermediação.
Além disso, a Receita Federal também acredita que a maioria dos problemas relacionados à evasão fiscal no setor de criptoativos ocorre na cadeia de operações das exchanges estrangeiras, sobre as quais o órgão tem controle limitado.
Em contraste, a desconfiança em relação às corretoras de criptomoedas sediadas no Brasil é menor, pois o Fisco tem acesso direto às informações das operações de compra e venda realizadas por essas plataformas. Esse fator permite verificar se tanto as empresas quanto os investidores estão cumprindo suas obrigações fiscais, como a declaração e o pagamento dos impostos devidos.
Pessoas físicas que investem em criptoativos por meio dessas plataformas também estão sujeitas ao pagamento de Imposto de Renda sobre o ganho de capital obtido com esses investimentos. Dessa forma, a Receita pode monitorar mais efetivamente o cumprimento das regras fiscais por parte dos investidores que utilizam corretoras brasileiras.
Regras estão sendo construídas
O mercado de criptomoedas no Brasil ainda está em fase de desenvolvimento regulatório, com as regras específicas para a negociação de criptoativos no país ainda em construção, mesmo após a promulgação de uma lei em 2022 que atribuiu ao Banco Central (BC) a responsabilidade por essa regulação. Enquanto o setor cresce, as autoridades reconhecem que existem irregularidades ainda não completamente identificadas, especialmente em relação à sonegação de impostos, como o IOF sobre operações de câmbio.
Um dos principais desafios apontados pela Receita Federal é a prática de algumas plataformas estrangeiras que realizam intermediações financeiras sem que o dinheiro efetivamente saia do país, o que deveria gerar incidência de impostos sobre o faturamento. No entanto, essas plataformas têm encontrado maneiras de escapar dessa tributação.
Desde o ano passado, a Receita já tem dialogado com associações do setor de criptoativos, em uma tentativa de regularizar as operações de forma semelhante ao que foi feito com o e-commerce. No entanto, para as criptomoedas, o objetivo não é alterar o trâmite tributário, mas sim intensificar a relação entre o Fisco e as empresas, com foco na regularização das atividades.
Em junho, o governo formalizou um grupo de trabalho com o intuito de orientar as exchanges sobre suas obrigações tributárias, estruturar a coleta de informações sobre depositantes e sacadores das contas das corretoras e definir uma estratégia de atuação em caso de descumprimento das regras. Esse grupo está alinhado ao novo modelo de atuação do Fisco, que busca um diálogo com os contribuintes antes de recorrer a autuações.
Na semana passada, uma primeira reunião foi realizada com empresas nacionais e estrangeiras que atuam no setor de criptomoedas. A expectativa é que o programa de regularização seja lançado ainda neste ano, conforme indicado por membros da Fazenda. Esse programa pretende enviar um claro recado às empresas do setor para que acelerem o processo de regularização no país.
Governo inicia intercâmbio com OCDE
O governo brasileiro deu início ao processo de adesão ao “Crypto-Asset Reporting Framework (Carf)”, um modelo de intercâmbio de informações entre países desenvolvido pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Esse framework visa facilitar a fiscalização do setor de criptoativos, considerando o caráter transnacional dessas operações e a necessidade de maior controle sobre as transações que envolvem criptomoedas.
Esse movimento é parte de um esforço mais amplo para aumentar a transparência e a conformidade tributária no mercado de criptomoedas. A adesão ao Carf permitirá que o Brasil compartilhe e receba informações sobre transações envolvendo criptoativos de outros países, o que pode ser crucial para a detecção de irregularidades e para a prevenção de práticas como a lavagem de dinheiro.
A Binance, uma das maiores corretoras de criptomoedas do mundo, que atualmente não possui registro no Brasil, afirmou em nota que mantém um diálogo contínuo com as autoridades tanto no Brasil quanto globalmente. A corretora também confirmou que enviou representantes para a reunião com a Receita Federal na semana passada, demonstrando sua disposição em cooperar com o processo de regulamentação e fiscalização em andamento.
Esse desenvolvimento sinaliza um compromisso crescente por parte do governo em alinhar a regulação das criptomoedas com padrões internacionais, ao mesmo tempo em que trabalha para regularizar e integrar o setor de criptoativos dentro da estrutura legal e tributária brasileira.