Bonds da Raízen despencam 19% e expõem fragilidade do crédito corporativo brasileiro
A produtora de biocombustíveis, controlada pela Shell e pela Cosan, enfrenta custos elevados, safras ruins e altos níveis de endividamento.

Os bonds da Raízen (RAIZ4) registraram forte desvalorização na última semana, refletindo a crescente aversão ao risco entre investidores do mercado de crédito brasileiro. Os títulos emitidos pela produtora de biocombustíveis — uma joint venture entre a Shell e a Cosan (CSAN3) — caíram quase 19%, atingindo mínimas históricas, em meio à piora do sentimento sobre empresas endividadas no país. O movimento ocorreu após liquidações em outras companhias, como Ambipar e Braskem, e acendeu o alerta entre gestores de fundos de dívida.
Nesta terça-feira (14), os papéis com vencimento em 2035 mostraram leve recuperação, subindo cerca de 4 centavos por dólar, com rendimento aproximado de 9%, segundo dados de mercado.
Custos crescentes e cenário adverso pressionam a Raízen
Antes considerada um símbolo da força do agronegócio brasileiro, a Raízen enfrenta custos operacionais mais altos, safras desfavoráveis e investimentos em novas frentes, como o etanol de biomassa e o combustível sustentável de aviação, que ainda não geram retorno consistente.
Esses fatores têm elevado o endividamento e comprometido parte do caixa da companhia, levando investidores a reduzir exposição diante da percepção de risco crescente.
O receio se intensificou após problemas no Banco Master, que busca capital para recompor perdas com ativos de risco, e depois das fortes quedas observadas em títulos da Ambipar (AMBP3) e da Braskem (BRKM5). O ambiente é de maior cautela, com operadores reavaliando posições em emissores corporativos considerados vulneráveis.
“Os investidores estão muito nervosos, preferindo atirar primeiro e fazer perguntas depois ao menor sinal de dificuldade”, afirmou Ian McCall, sócio da First Geneva Capital Partners.
Tensão no crédito atinge todo o mercado brasileiro
A deterioração dos bonds da Raízen ocorre em um contexto mais amplo de tensão no crédito corporativo brasileiro, que sofre com a taxa básica de juros elevada — atualmente em torno de 15% — e o endividamento alto das companhias.
O nervosismo se espalhou para outros mercados emergentes, como a Turquia, após um período de desempenho sólido no setor de dívida.
Nos últimos 30 dias, os títulos corporativos brasileiros lideraram as perdas entre emergentes, com recuo médio de 7%, enquanto o índice geral de títulos de países emergentes caiu apenas 0,5%.
A volatilidade reflete a desconfiança crescente sobre a capacidade das empresas brasileiras de gerar caixa suficiente para sustentar o serviço da dívida.
Raízen reforça posição de caixa, mas mercado segue desconfiado
Nos três meses encerrados em 30 de junho, a Raízen consumiu R$ 7 bilhões de caixa, elevando sua dívida líquida em 56%, para R$ 49,2 bilhões, em relação ao mesmo período do ano anterior. O custo do serviço da dívida chegou a R$ 1,62 bilhão, equivalente a cerca de 86% do lucro antes de juros e impostos (EBIT).
Em comunicado divulgado na sexta-feira (10), a empresa afirmou não ter planos de reestruturar suas dívidas e destacou uma posição de caixa robusta, de R$ 15,7 bilhões, além do acesso a US$ 1 bilhão em linhas de crédito rotativo. Segundo a companhia, discussões sobre uma capitalização seguem em andamento, mas ainda sem novos anúncios.
Apesar disso, o mercado segue cauteloso. Casos recentes de empresas endividadas levaram analistas a questionar a credibilidade das declarações sobre liquidez.
“Depois do caso Braskem, a narrativa de ‘forte posição de caixa’ já não convence. O foco agora é a geração sustentável de caixa livre”, observou Juan Manuel Patiño, analista da Sun Capital Valores.
Achou este post útil? Siga o Melhor Investimento nas redes sociais e não perca nenhuma atualização: