Impulsionadas por medidas de austeridade pró-mercado implementadas pelo presidente liberal Javier Milei, as ações dos bancos argentinos tiveram uma valorização expressiva ao longo do ano, superando empresas bancárias brasileiras, como Itaú (ITUB4) e Banco do Brasil (BBAS3), e até grandes nomes de tecnologia, como a Nvidia (NVDC34).

A holding argentina Grupo Supervielle (SUPV), que oferece produtos e serviços bancários no país, teve uma impressionante alta de 469,50% nos últimos 12 meses. O Banco Macro (BMA) e o Grupo Financeiro Galicia (GGAL) também se destacaram, com valorizações de 430% e 410%, respectivamente.

Enquanto isso, o Banco BBVA Argentina registrou uma alta de 300% no mesmo período, segundo dados da plataforma TradingView.

Mas o que explica essa alta?

Quando assumiu o governo no final do ano passado, Javier Milei implementou uma rigorosa política de austeridade com o objetivo de combater a inflação e manter o equilíbrio fiscal. Entre as medidas, destacam-se a redução da taxa de juros e o controle cambial, que, segundo especialistas, favoreceram a oferta de crédito e o financiamento imobiliário.

Assim como no Brasil e em outras partes do mundo, os bancos argentinos aumentam suas receitas por meio dos juros cobrados em empréstimos. Em maio, as filas em agências bancárias refletem essa demanda, com taxas de juros variando entre 3,5% e 8,5%, de acordo com um levantamento da Bloomberg.

Pedro Moreira, sócio da One Investimentos, explicou que o controle cambial e a redução dos juros ampliaram a disposição da população argentina em contratar financiamentos imobiliários e incentivaram os bancos a oferecer melhores condições de crédito. Com isso, o país atingiu o maior número de financiamentos imobiliários dos últimos seis anos.

Diante desse novo cenário, bancos como BBVA Argentina e Galicia preveem um crescimento real de 30% nos empréstimos até o final de 2024 em comparação com o ano anterior. Já o Supervielle e o Macro projetam uma alta de 15% a 20%, segundo dados da revista britânica Euromoney no final de agosto.

Aumento de dólares nos bancos

Outro fator que impulsionou o setor bancário argentino foi o aumento significativo dos depósitos em dólares. Segundo dados do Banco Central da Argentina, o montante de moeda estrangeira enviado ao sistema bancário formal alcançou US$ 24 bilhões em setembro, comparado a US$ 16,5 bilhões em dezembro.

Pedro Moreira, sócio da One Investimentos, destacou que esse movimento trouxe maior segurança para o setor bancário, permitindo que as instituições financeiras ampliassem a oferta de crédito à população. “Isso fez com que os bancos argentinos tivessem melhor performance”, afirmou.

Anteriormente, a desvalorização cambial gerava receio entre os argentinos, que preferiam guardar seus dólares em casa, enviá-los para o exterior ou investir em stablecoins (criptomoedas atreladas a moedas fiduciárias), em vez de depositá-los nos bancos.

Investimento do exterior

A entrada de investimento exterior também respingou no setor bancário, que foi o principal responsável pela disparada de 96% da bolsa argentina neste ano. Vale ressaltar que esse desempenho é 40 vezes superior ao registrado pelo Ibovespa e pela perfomance do ETF (fundo de índice) de NY com ações globais do país, que chegou ao posto de melhor do mundo neste mês.

Segundo dados do governo, no primeiro trimestre de 2024, o fluxo estrangeiro direto na nação foi de US$ 6,5 milhões em entradas líquidas. Um dos principais setores a receber os valores foi o de “instituições que aceitam depósitos, exceto o banco central”, seguido por “indústria de manufatura”, “exploração de minas e pedreiras” e “atacadistas e varejistas, oficinas de reparo de veículos e motocicletas”.

Futuro

Apesar da alta das ações e do otimismo no setor bancário argentino, os resultados ainda mostram desafios significativos. No primeiro semestre de 2024, os bancos do país registraram uma receita líquida de juros (NII) negativa, uma das métricas mais importantes para avaliar o desempenho financeiro de instituições bancárias.

O NII reflete a diferença entre o que o banco ganha com ativos como ações e títulos, e os custos relacionados a essas operações. Isso indica que, apesar dos avanços, o setor ainda precisa se ajustar.

O cenário econômico da Argentina também continua sendo uma preocupação. De acordo com a escala de risco do grupo financeiro Allianz, o país está na posição 4, a mais arriscada, devido a desequilíbrios macroeconômicos, reservas cambiais limitadas e uma moeda desvalorizada.

Rafael Haubrich, head de offshore da Manchester Investimentos, afirmou que, embora o desempenho recente seja positivo, os fatores macro e microeconômicos podem influenciar os ativos nos próximos meses.

Ele também destaca que o país ainda enfrenta inflação elevada e desvalorização cambial, o que pode aumentar as pressões sobre o governo e criar um ambiente de incerteza no longo prazo.

Gabryella Mendes

Redatora do Melhor Investimento.