As operações de fusões e aquisições, mais conhecidas pelo termo em inglês M&A (Mergers and Acquisitions), tornaram-se uma parte essencial da estratégia corporativa de muitas empresas. A forma como o M&A se encaixa na estratégia e complementa seu crescimento depende do setor em que opera, de sua posição no mercado e estratégia de criação de valor.

Por meio dessas operações, as empresas podem dar saltos importantes em mercados cada vez mais competitivos. Um M&A pode, por exemplo, ajudá-las a aproveitar os benefícios de escala, resultantes da consolidação em mercados maduros, e a ganhar acesso a novas tecnologias, produtos e canais de distribuição.

No contexto atual, essas operações são uma das protagonistas do cenário corporativo, especialmente no setor de Venture Capital.

A importância das operações de M&A

A relevância do M&A reside na sua capacidade de transformar estruturas corporativas. Segundo a PwC (2023), as operações de M&A ao redor do mundo totalizaram aproximadamente USD 3,6 trilhões em 2022 — e empresas de diversos setores aproveitaram essa oportunidade para impulsionar seu crescimento.

Por exemplo, nos últimos 2 anos, a Microsoft adquiriu a gigante dos videogames Activision Blizzard por cerca de USD 68,7 bilhões, uma das maiores aquisições no setor de tecnologia. Em uma movimentação similar, a Broadcom anunciou a aquisição da VMware por aproximadamente USD 61 bilhões, reforçando sua presença no mercado de software e serviços de nuvem. Além disso, uma das transações mais repercutidas mundialmente foi a compra do Twitter por Elon Musk, no valor de USD 44 bilhões, refletindo o impacto das grandes fusões e aquisições no setor de mídia e tecnologia.

Essas operações são complexas, e ao mesmo tempo encantadoras porque envolvem áreas como Finanças, Direito, Contabilidade e até mesmo Cultura Corporativa. Por vezes, pensamos que o assunto está resolvido quando as partes, comprador e vendedor, combinam um determinado preço pela transação — que não é “valor” da transação, mas isso é assunto para outro artigo.

Mas, na prática, os desafios estão apenas começando: infindáveis contratos, cláusulas complexas de serem compreendidas, aspectos tributários e integração pós-assinatura do acordo. Essa última, por sua vez, tem chamado cada vez mais atenção da academia e do mercado. Como integrar empresas com tecnologias, processos e culturas distintas?

Expansão Inorgânica, Diversificação e Ganhos de Eficiência

As motivações por trás de uma operação de M&A são diversas. A primeira delas pode ser uma simples estratégia de expansão inorgânica, mais especificamente quando as empresas desejam aumentar sua participação de mercado através de aquisições. Com isso, uma organização pode acessar novos mercados, adquirir tecnologias e incorporar talentos que seriam difíceis ou demorados de desenvolver internamente. Por exemplo, uma empresa que deseja expandir suas operações para um novo país pode adquirir uma empresa local, economizando tempo e recursos que seriam necessários para construir uma presença do zero.

Outra motivação para uma operação de M&A é a diversificação de operações, reduzindo riscos operacionais e financeiros com a expansão do portfólio de produtos e serviços, ou entrada em novos mercados. Essa estratégia também pode proteger a empresa contra flutuações de mercado e ciclos econômicos adversos, proporcionando uma base de receita mais estável e resiliente.

A última delas, talvez a mais debatida e por vezes questionada, é a incessante busca por sinergias operacionais. Essas sinergias proporcionam ganhos de eficiência e economia de escala e ocorrem quando a combinação de duas ou mais empresas resulta em um valor maior do que a soma de suas partes individuais. A obtenção de sinergias operacionais requer uma cuidadosa integração das empresas envolvidas, incluindo a harmonização de culturas corporativas, alinhamento de estratégias e a implementação de práticas de gestão de mudanças eficazes. Quando bem-sucedida, pode resultar em uma organização mais eficiente, competitiva e lucrativa.

O Cenário de M&A no Brasil

O mercado de fusões e aquisições (M&A) no Brasil tem mostrado sinais claros de recuperação e crescimento, retomando a tendência positiva iniciada no segundo semestre do ano passado. De abril a junho de 2024, o Brasil registrou 426 operações de M&A, marcando o maior número de transações em um trimestre nos últimos dois anos, segundo levantamento da KPMG obtido pelo Broadcast. 

Após uma queda de 5,9% no primeiro trimestre, as transações envolvendo empresas brasileiras cresceram 16,7% em comparação ao mesmo período do ano anterior. Com isso, o primeiro semestre de 2024 encerrou com um total de 776 transações, um aumento de 5,3% em relação aos seis primeiros meses de 2023. O estudo da KPMG considera acordos superiores a R$ 50 milhões e aponta que o cenário atual é promissor para as fusões e aquisições, refletindo uma recuperação consistente e uma dinâmica positiva no mercado brasileiro.

O M&A como Saída Estratégica para Startups

No contexto atual, as operações de M&A têm se destacado como uma alternativa estratégica e eficiente para as startups. Embora os IPOs (Ofertas Públicas Iniciais) sejam frequentemente vistos como o objetivo final para muitas empresas, o M&A oferece vantagens que tornam essa saída mais atraente, especialmente no cenário brasileiro.

Uma delas é que a saída costuma estar disponível mais cedo para as startups, em especial quando comparada ao IPO — que, quase por definição, é restrito a empresas de maior porte, especialmente no Brasil. O processo de IPO é regulado pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e envolve uma série de requisitos rigorosos. As operações de M&A, em contrapartida, de M&A são menos complexas do ponto de vista regulatório, permitindo uma negociação mais direta entre as partes envolvidas. 

Através do M&A, as startups não ficam reféns das janelas demoradas de IPO. Embora o IPO possa oferecer valuations mais altos, o processo é longo e as oportunidades podem fechar rapidamente. Além disso, o país tem vivido um período de escassez de IPOs. A última oferta pública aberta na Bolsa de Valores aconteceu em agosto de 2021, com a companhia de biotecnologia Vittia, que levantou R$ 382 milhões. (Folha de São Paulo)

M&A e Early Exit de Startups

Para muitas startups, as operações de M&A funcionam como um catalisador para o crescimento. Quando adquiridas por empresas maiores ou investidores estratégicos, as startups podem acessar recursos financeiros, novas tecnologias e uma base de clientes expandida. 

Para os investidores, as operações de M&A oferecem uma oportunidade para obter liquidez e retornos financeiros sobre o capital investido, muitas vezes com múltiplos significativos em relação ao valor inicial. No mercado brasileiro, a predominância de operações de médio porte reflete a busca contínua por liquidez e oportunidades estratégicas; e mais de 90% das transações são inferiores a R$ 500 milhões, e 80% são abaixo de R$ 250 milhões. 

É nesse contexto que a estratégia de Early Exit tem ganhado destaque. Essa abordagem permite que startups realizem saídas bem-sucedidas antes de completarem um ciclo inteiro de venture capital, gerando liquidez em um prazo significativamente menor para os investidores que aportaram nelas. Um exemplo dessa dinâmica é a trajetória da fintech MeuPortfolio, uma plataforma SaaS para gestão de investimentos, que concluiu uma rodada de captação na EqSeed em 2021. No ano seguinte, a empresa foi adquirida pela Warren Investimentos.

A aquisição da MeuPortfolio pela Warren permitiu que os clientes da corretora tivessem acesso a um serviço que antes estava disponível apenas para o público de alta renda. Na prática, a tecnologia da MeuPortfolio possibilitou que os clientes acompanhassem a totalidade de seu patrimônio pela plataforma da Warren, independentemente de onde está aplicado — além de contribuir com projetos de Open Banking.

O exemplo da MeuPortfolio ilustra como uma saída bem-cronometrada pode não apenas maximizar os retornos para investidores, mas também gerar um impacto significativo no setor como um todo. Em um cenário onde agilidade e inovação são essenciais, o Early Exit se afirma como uma ferramenta que proporciona uma realização de ganhos mais rápida, permitindo que investidores busquem novas oportunidades e startups escalem suas operações, adaptando-se às mudanças do mercado.

Igor Monteiro

Sócio e CEO da EqSeed. Igor é Ph.D em Finanças (PUC-RJ) com extensão nos EUA e especialista em valuation com vasta experiência em M&A e Venture Capital. Liderou processos de investimentos em startups e operações de M&A, no Brasil e exterior. Acumula passagens por boutique de M&A, Family-office e instituições financeiras. Foi professor do MBA de Gestão de Investimentos da PUC-Rio.